Desfaunação - Mata atlântica foi 'esvaziada'
de mamíferos, diz estudo.
O termo parece um palavrão
e, de fato, a situação que descreve não é nada bonita: "desfaunação".
Ou seja, o sumiço da fauna -- um fenômeno que parece ter afetado 80% da mata
atlântica que ainda resta numa região vasta, que vai do leste de Minas Gerais a
Sergipe.
Nessas regiões, uma
hecatombe parece ter exterminado quase todos os mamíferos pesando mais de 5 kg
-- mesmo quando a floresta propriamente dita, à primeira vista, está intacta,
mostra um novo estudo, que acaba de ser publicado na revista científica
"PLoS ONE".
A pesquisa, feita por uma equipe que
inclui os brasileiros Gustavo Canale, da Unemat (Universidade do Estado de Mato
Grosso) em Tangará da Serra, Carlos Peres, da Universidade de East Anglia
(Reino Unido), Cassiano Gatto (Inpa), Carlos Guidorizzi (ICMBio) e Cecília
Kierulff (Instituto Pri-Matas), envolveu um levantamento numa área de mais de
250 mil km 2 de mata atlântica em Minas Gerais, Bahia e Sergipe.
Com ajuda de imagens de
satélite e aparelhos de GPS, os pesquisadores mapearam os principais fragmentos
de floresta nessa região --cerca de 200. A equipe, então, fez levantamentos
rápidos da fauna em cerca de 50 deles. Nos demais casos, entrevistaram
moradores da zona rural de cada região, os quais estivessem habituados a
visitar a mata e morassem havia anos perto da floresta, em busca de informações
sobre as espécies que eles costumavam ver nos fragmentos de floresta.
O alvo da equipe era um
conjunto de 18 espécies de mamíferos de porte grande e médio. São animais como
onças, antas, veados, tamanduás e macacos-pregos. Um dos critérios para
escolher esses bichos específicos como indicadores do estado da fauna nos
fragmentos de mata, explicou Gustavo Canale à Folha, foi o fato de que seria
fácil para os moradores identificá-los numa conversa com os cientistas.
"A gente queria evitar
espécies mais crípticas [de identificação mais difícil] ou ariscas, como
gatos-do-mato ou jaguatiricas", afirma ele. "Também são bichos
bastante caçados, o que leva os moradores a procurá-los mais na mata. E também
são relativamente pouco exigentes em termos de ambiente."
RESTAM
QUATRO
O resultado não foi dos
mais auspiciosos: das 18 espécies de mamíferos, só quatro, em média, ainda
ocorrem por fragmento de mata com tamanho entre 50 hectares e 5.000 hectares.
Mesmo em trechos de floresta
considerados muito grandes para o estado atual da mata atlântica (os com mais
de 5.000 hectares), só sete espécies, em média, ainda estavam presentes.
Na prática, isso significa
que bichos como onças-pintadas, queixadas (um tipo de porco-do-mato), tamanduás-bandeiras,
antas e muriquis (o maior macaco das Américas) estão praticamente extintos
nesse pedaços importantes da mata atlântica.
Preguiças, pacas, bugios e
raposas se saem só um pouco melhor. Os únicos mamíferos a resistirem em mais de
metade dos fragmentos estudados são os saguis.
"Uma coisa
interessante que nós vimos é que, no caso dos remanescentes florestais, tamanho
não é documento", afirma Canale. "A gente esperaria que, quanto maior
o fragmento, maior a chance de ele preservar uma diversidade mais ampla de
espécies, mas não é o que acontece."
A explicação para o estrago
até nos remanescentes florestais maiores, segundo os pesquisadores, é
relativamente simples: mesmo quando a mata não era derrubada, a caça nessas
regiões continuou e ainda hoje é muito comum, o que acabou com as espécies
grandes.
A situação só é diferente,
afirmam eles, nos fragmentos que também são áreas protegidas por lei. Nesses
lugares, mostra o estudo, a maioria das espécies ainda pode ser encontrada -o
que, para os biólogos, indica que é preciso criar mais áreas protegidas de
forma efetiva.
DIFERENÇAS
REGIONAIS?
Para o biólogo da Unemat, é
difícil saber se essa situação desoladora é a mesma em outras regiões da mata
atlântica, no Sudeste e no Sul, por exemplo.
"Todo mundo tinha a
sensação de que essas espécies estavam dançando na mata atlântica do Nordeste.
O que o nosso trabalho é quantificar isso. Não existe uma quantificação
comparável para outras regiões, mas pode ser que a situação seja um pouco
melhor no Sudeste por razões históricas, pelo tipo de caça preferida, por
exemplo. A gente sente que a pressão de caça no Nordeste é mais intensa -- em
vez de comer só porco-do-mato ou veado, por exemplo, as pessoas também comem
preguiça, comem macaco", explica.
Fonte: UOL
Ciências - 15/08/2012
- 05h03
http://www1.folha.uol.com.br/ciencia/1137398-mata-atlantica-foi-esvaziada-de-mamiferos-diz-estudo.shtml
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